Por que Dick Hallorann merece série própria após ‘IT: A Coisa’

Analisamos por que Dick Hallorann, resgatado do limbo por ‘IT: Bem-Vindos a Derry’, merece um spinoff que conecte Pennywise ao Overlook Hotel — e como Mike Flanagan já tinha o roteiro perfeito para isso.

Existe um personagem no universo de Stephen King que passou décadas sendo subutilizado em adaptações — e ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ finalmente fez justiça a ele. Dick Hallorann, o cozinheiro com poderes psíquicos que a maioria conhece como “aquele cara que morre rápido em ‘O Iluminado'”, ganhou na série da HBO a profundidade que Stanley Kubrick negou a ele em 1980. E agora que a série estabeleceu essa versão do personagem, a pergunta que não quer calar: por que diabos ainda não anunciaram um Dick Hallorann spinoff?

A resposta curta é que deveriam. A resposta longa envolve entender como ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ corrigiu um erro histórico, como Mike Flanagan já tinha um roteiro pronto para essa história, e por que Chris Chalk merece a chance de expandir esse personagem.

O que Stanley Kubrick fez de errado com Hallorann

O que Stanley Kubrick fez de errado com Hallorann

‘O Iluminado’ de Kubrick é um filme tecnicamente impecável que funciona como terror psicológico, mas é uma adaptação questionável do livro de Stephen King. E nenhum personagem sofreu mais com isso do que Dick Hallorann.

No romance, Hallorann é uma figura central. Ele é o mentor que ensina Danny Torrance a entender seus poderes, um homem com história própria, traumas próprios, e uma conexão profunda com o sobrenatural que vai muito além de “sentir coisas ruins”. No filme do Kubrick? Ele aparece, explica o “shining” em duas cenas, viaja o país inteiro para salvar o garoto e leva uma machadada no peito antes de fazer qualquer coisa útil.

É o equivalente cinematográfico de chamar um especialista para uma reunião importante e mandá-lo embora antes de ele abrir a boca. Kubrick transformou um personagem rico em um dispositivo de plot — alguém que existe apenas para morrer e mostrar que Jack Torrance é perigoso. King nunca escondeu sua frustração com isso, e qualquer leitor do livro entende o porquê.

Como ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ resgatou o personagem

A série da HBO fez algo que nenhuma adaptação anterior teve coragem de fazer: tratou Hallorann como protagonista de sua própria história, não como coadjuvante na história de outros.

Chris Chalk interpreta uma versão do personagem que não é simplesmente “o cara bom com poderes”. Seu Hallorann é moralmente ambíguo, carrega culpa, toma decisões questionáveis. A série acompanha sua catarse — a transformação de alguém que poderia ter sido vilão em um dos maiores salvadores de Derry. Isso é arco de personagem. Isso é desenvolvimento. Isso é o que Kubrick jogou fora em 1980.

E o mais interessante: a série planta sementes para o futuro. Antes de ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ terminar sua temporada, Hallorann anuncia que está partindo para Londres para trabalhar na cozinha de um hotel. Quem conhece a cronologia de King sabe onde isso vai dar: eventualmente, ele acaba no Overlook Hotel, no Colorado, onde encontrará os Torrance e os Grady.

Quando Hanlon pede para Hallorann entrar em contato se encontrar problemas, ele responde: “Quanto problema um hotel pode dar?” A ironia é deliciosa — e cruel. Ele não faz ideia do que o espera.

Mike Flanagan já tinha o roteiro perfeito para um spinoff

Mike Flanagan já tinha o roteiro perfeito para um spinoff

Aqui é onde a história fica ainda mais frustrante. Mike Flanagan, o diretor de ‘Doutor Sono’ (2019), não só deu a Hallorann um papel mais significativo no filme como já tinha planos concretos para um spinoff focado no personagem.

A ideia, que Flanagan revelou em entrevistas, começaria com Hallorann trabalhando na cozinha do Overlook Hotel, preparando o lugar para a chegada do novo zelador de inverno. Até aí, parece previsível. Mas então ele entraria no Quarto 237 — e teria flashbacks de seu tempo em Derry, revivendo seus encontros com Pennywise.

Pense nisso por um segundo. Um filme que conectaria diretamente o universo de ‘IT’ com ‘O Iluminado’, usando Hallorann como ponte. Dois dos pilares do terror de Stephen King, unidos pela experiência de um único personagem. E no final, quando o público esperasse ver os Torrance chegando ao hotel? Surpresa: seriam os Grady.

O projeto nunca saiu do papel porque ‘Doutor Sono’ não performou bem nas bilheterias — arrecadou US$ 72 milhões contra um orçamento de US$ 45 milhões, um resultado morno que esfriou o entusiasmo da Warner por expandir o universo. Mas agora, com o sucesso recorde de ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ na HBO, essa história tem uma segunda chance.

Por que Chris Chalk é a escolha certa para carregar esse spinoff

Não adianta ter uma boa história se não houver o ator certo para contá-la. E Chris Chalk provou em ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ que consegue carregar Hallorann nos ombros.

O que ele faz com o personagem vai além de “atuar bem”. Chalk captura algo difícil de definir — aquela mistura de medo e determinação, de culpa e coragem, que torna Hallorann mais do que um herói genérico. Você acredita que esse homem viu coisas terríveis. Você acredita que ele fez escolhas das quais se arrepende. E você acredita que, mesmo assim, ele vai fazer a coisa certa quando importa.

Há uma cena específica em ‘Bem-Vindos a Derry’ onde Hallorann confronta suas próprias memórias de Pennywise — e Chalk consegue transmitir décadas de trauma reprimido apenas com o olhar. É o tipo de atuação que não depende de diálogo expositivo, que confia na capacidade do público de ler entrelinhas. Ver Chalk explorar as camadas adicionais que um spinoff traria — os horrores do Overlook, as memórias de Pennywise ressurgindo, o peso de saber que algo terrível vai acontecer e não poder evitar — seria um presente para quem acompanha o universo de King.

As duas direções possíveis para um Dick Hallorann spinoff

As duas direções possíveis para um Dick Hallorann spinoff

Se a HBO decidir seguir em frente com essa ideia (e, dado o sucesso da série, seria surpreendente se não considerassem), existem basicamente dois caminhos.

O primeiro é o que Flanagan imaginou: acompanhar Hallorann adulto no Overlook Hotel, explorando como a influência de Pennywise continua assombrando sua mente enquanto ele enfrenta os novos terrores do hotel. Seria uma história sobre trauma que não desaparece, sobre como o mal de um lugar pode despertar o mal de outro. E teria a vantagem de conectar as duas franquias de forma orgânica — algo que o universo cinematográfico de King nunca conseguiu fazer de verdade.

O segundo caminho seria ir ainda mais para trás — mostrar a infância de Hallorann, seus primeiros encontros com seus poderes de “shining”, e como sua avó o ajudou a entender e controlar essas habilidades. King dedica páginas do romance original a esse backstory, e há material rico sobre uma criança negra no sul dos Estados Unidos dos anos 1930 descobrindo que pode ver coisas que ninguém mais vê.

A primeira opção me parece mais rica cinematograficamente. A conexão entre Derry e o Overlook, entre Pennywise e os fantasmas do hotel, entre o trauma de infância e os horrores da vida adulta — isso é material para uma série que poderia ser tão boa quanto ‘IT: Bem-Vindos a Derry’, se não melhor. E resolveria uma questão que sempre incomodou fãs: como Hallorann, que sobreviveu a Pennywise, acabou morrendo tão facilmente no Overlook?

O momento é agora

‘IT: Bem-Vindos a Derry’ ainda não foi oficialmente renovada para uma segunda temporada, mas seu sucesso de audiência na HBO sugere que isso é questão de tempo. E enquanto os executivos decidem o futuro da franquia, a oportunidade de expandir o universo com um spinoff de Hallorann está ali, esperando.

A história já existe, cortesia de Mike Flanagan. O ator perfeito já está no papel, cortesia de Chris Chalk. O público está engajado com o personagem, cortesia de uma temporada que finalmente fez justiça a ele. Todos os ingredientes estão na mesa.

Dick Hallorann passou quarenta e cinco anos sendo tratado como nota de rodapé nas adaptações de Stephen King. ‘IT: Bem-Vindos a Derry’ provou que ele merece ser protagonista. Agora só falta alguém na HBO ter a coragem de apertar o botão verde.

E se não tiverem? Bem, pelo menos temos uma temporada onde Hallorann finalmente brilhou. Mas seria um desperdício parar por aí — especialmente quando a pergunta “quanto problema um hotel pode dar?” ainda está esperando uma resposta.

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Perguntas Frequentes sobre Dick Hallorann

Quem interpreta Dick Hallorann em ‘IT: Bem-Vindos a Derry’?

Chris Chalk interpreta Dick Hallorann na série da HBO. O ator é conhecido por seus papéis em ‘Gotham’ (Lucius Fox) e ‘Perry Mason’.

Dick Hallorann aparece em ‘O Iluminado’ e ‘IT’?

Sim. Nos livros de Stephen King, Hallorann é um personagem que conecta ambas as histórias. Ele aparece jovem em Derry (durante os eventos de ‘IT’) e adulto no Overlook Hotel (em ‘O Iluminado’). As adaptações cinematográficas nunca exploraram essa conexão até ‘IT: Bem-Vindos a Derry’.

Mike Flanagan vai dirigir um spinoff de Dick Hallorann?

Não há confirmação oficial. Flanagan revelou que tinha um roteiro para um spinoff focado em Hallorann após ‘Doutor Sono’, mas o projeto foi engavetado devido à bilheteria morna do filme. Com o sucesso de ‘IT: Bem-Vindos a Derry’, fãs especulam que a ideia pode ser retomada.

Por que Stephen King não gostou do Hallorann de Kubrick?

No livro, Hallorann sobrevive e é fundamental para o resgate de Danny e Wendy. Kubrick o matou rapidamente, reduzindo-o a um dispositivo de plot. King criticou publicamente essa escolha, argumentando que desperdiçou um personagem com profundidade e história própria.

Onde assistir ‘IT: Bem-Vindos a Derry’?

A série está disponível na HBO e Max. A primeira temporada completa foi lançada em 2025.

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Lucas Lobinco
Lucas Lobinco
Sou o Lucas, e minha paixão pelo cinema começou com as aventuras épicas e os clássicos de ficção científica que moldaram minha infância. Para mim, cada filme é uma nova oportunidade de explorar mundos e ideias, uma janela para a criatividade humana. Minha jornada não foi nos bastidores da produção, mas sim na arte de desvendar as camadas de uma boa história e compartilhar essa descoberta. Sou movido pela curiosidade de entender o que torna um filme inesquecível, seja a complexidade de um personagem, a inovação visual ou a mensagem atemporal. No Cinepoca, meu foco é trazer uma perspectiva única, mergulhando fundo nos detalhes que fazem um filme valer a pena, e incentivando você a ver a sétima arte com novos olhos.Tenho um apreço especial por filmes de ação e aventura, com suas narrativas grandiosas e sequências de tirar o fôlego. A comédia de humor negro e os thrillers psicológicos também me atraem, pela forma como subvertem expectativas e exploram o lado mais sombrio da psique humana. Além disso, estou sempre atento às novas vozes e tendências que surgem na indústria, buscando os próximos grandes talentos e as histórias que definirão o futuro do cinema.

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