Analisamos por que ‘Fargo’ (1996) continua sendo a obra-prima definitiva dos irmãos Coen. Descubra como a fotografia de Roger Deakins e a atuação de Frances McDormand criaram um novo padrão para o humor negro e o crime no cinema, agora disponível na Max.
Há filmes que tentam emular a vida, e há ‘Fargo’ filme 1996, que prefere observar a estupidez humana sob uma lente de aumento gelada. Quase trinta anos após seu lançamento, a obra-prima de Joel e Ethan Coen não é apenas um clássico; é um ecossistema narrativo onde o niilismo e a decência básica travam um duelo silencioso em meio à neve de Minnesota.
A partir de 1º de janeiro, o filme deixa a Paramount+ e passa a integrar o catálogo da Max. Para o espectador de 2025, saturado de thrillers que explicam demais, revisitar ‘Fargo’ é um choque de precisão. O que os Coen entregaram com parcos US$ 7 milhões foi uma lição de como o design de som, a trilha sonora melancólica e o silêncio podem ser mais aterrorizantes do que qualquer explosão.
A anatomia do fracasso: Jerry Lundegaard e o crime medíocre
O coração de ‘Fargo’ não bate por um gênio do crime, mas pela respiração ofegante de Jerry Lundegaard. William H. Macy entrega uma performance física — repare na cena em que ele tenta raspar o gelo do para-brisa após um encontro frustrado; é a coreografia da impotência. Jerry não é um vilão; ele é um homem pequeno esmagado por dívidas que acredita ser capaz de controlar o caos.
Ao contratar Gaear (Peter Stormare) e Carl (Steve Buscemi), ele não está selando um pacto com profissionais, mas abrindo a caixa de Pandora da incompetência. Os diálogos de Buscemi, rápidos e nervosos, contrastam com o silêncio sociopata de Stormare. A genialidade do roteiro dos Coen reside em mostrar que o mal raramente é grandioso — na maioria das vezes, ele é apenas burro e irritado.
Marge Gunderson: A autoridade da normalidade
Se Jerry é o motor do filme, Marge Gunderson é sua bússola moral. Frances McDormand transformou o que poderia ser uma caricatura do meio-oeste em uma das protagonistas mais subversivas do cinema. Grávida de sete meses, Marge não resolve o crime através de deduções sherlockianas, mas através de uma ética de trabalho inabalável e uma percepção aguçada da natureza humana.
A cena em que ela interroga dois suspeitos enquanto come um hambúrguer, ou sua conversa final na viatura — onde ela simplesmente não consegue processar como alguém mataria por ‘um pouco de dinheiro’ — define o tom do filme. Ela é a prova de que a bondade não precisa ser ingênua para ser eficaz. É uma atuação de micro-expressões que rendeu a McDormand um Oscar histórico e merecido.
O uso técnico do ‘Branco sobre Branco’
Visualmente, ‘Fargo’ é um triunfo da colaboração entre os Coen e o diretor de fotografia Roger Deakins. Eles criaram uma estética de ‘branco sobre branco’, onde o horizonte desaparece e os personagens parecem flutuar em um vazio existencial. Essa escolha técnica não é apenas bonita; ela isola a violência. Quando o sangue finalmente tinge a neve, o impacto visual é visceral porque o cenário é de uma pureza absoluta.
Somado a isso, a trilha sonora de Carter Burwell — inspirada em temas folclóricos escandinavos — traz uma solenidade quase religiosa ao absurdo. A música não tenta te assustar; ela lamenta a tragédia que estamos presenciando. É essa dissonância entre a trilha épica e a pequenez dos atos criminosos que gera o humor negro único da obra.
A mentira que fundamenta a verdade
O famoso letreiro ‘This is a true story’ (Esta é uma história real) continua sendo um dos maiores ‘trolls’ da história do cinema. Os Coen admitiram anos depois que a trama é inteiramente fictícia. No entanto, essa escolha foi crucial para estabelecer o contrato com o público: ao acreditar que era real, o espectador aceitava as coincidências bizarras e a violência aleatória como fatos da vida, e não como conveniências de roteiro.
Por que ver o filme se você já viu a série?
A série antológica de Noah Hawley é brilhante, mas ela é uma expansão do universo. O ‘Fargo’ filme 1996 é a essência destilada. Em apenas 98 minutos, ele entrega uma economia narrativa que a televisão raramente consegue replicar. Cada frame de Deakins, cada hesitação na voz de Macy e cada ‘Yah’ de McDormand estão lá por uma razão. Se a série é uma exploração do DNA, o filme é a célula-tronco original — mais crua, mais fria e, de certa forma, mais impiedosa.
Prepare o café, ignore o frio lá fora e mergulhe na Max em janeiro. ‘Fargo’ não é apenas um filme sobre um sequestro que deu errado; é um espelho desconfortável sobre o que acontece quando a ganância encontra a mediocridade.
Para ficar por dentro de tudo que acontece no universo dos filmes, séries e streamings, acompanhe o Cinepoca também pelo Facebook e Instagram!
Perguntas Frequentes sobre o filme ‘Fargo’ (1996)
O filme ‘Fargo’ é realmente baseado em fatos reais?
Não. Apesar do letreiro inicial afirmar que os eventos ocorreram em 1987, a história é fictícia. Os irmãos Coen usaram esse recurso para dar um tom de realismo e documentário falso à narrativa.
Onde assistir ao filme ‘Fargo’ original?
A partir de 1º de janeiro de 2025, ‘Fargo’ estará disponível no catálogo da Max (antiga HBO Max). O filme também pode ser encontrado para aluguel e compra em plataformas como Apple TV e Google Play.
Preciso ver o filme para entender a série ‘Fargo’?
Não é obrigatório, pois a série é antológica e cada temporada tem uma história independente. No entanto, ver o filme ajuda a entender o tom, o estilo de humor e as referências visuais que a série homenageia constantemente.
Por que o filme se chama ‘Fargo’ se a maior parte se passa em Brainerd?
Os irmãos Coen escolheram o nome ‘Fargo’ (uma cidade na Dakota do Norte) simplesmente porque acharam o nome mais interessante e memorável do que ‘Brainerd’. A trama começa em Fargo, onde o plano do crime é selado.
Quantos Oscars o filme ‘Fargo’ venceu?
O filme venceu dois Oscars em 1997: Melhor Atriz para Frances McDormand e Melhor Roteiro Original para Joel e Ethan Coen.

