Três anos após sua estreia, ‘Em Nome do Céu’ permanece como o padrão ouro do true crime moderno. Analisamos como a atuação visceral de Andrew Garfield e a direção técnica transformam um crime real em uma profunda e necessária meditação sobre fé, fanatismo e as sombras da história americana.
‘Em Nome do Céu’ estreou em 2022 e, três anos depois, consolidou-se como uma anomalia no catálogo do streaming: um true crime que sobrevive ao ciclo de descarte imediato. Enquanto o gênero frequentemente se perde no sensacionalismo visual, a minissérie baseada na obra de Jon Krakauer usa o assassinato brutal de Brenda Lafferty, em 1984, como pretexto para uma autópsia perturbadora do fundamentalismo religioso.
A invenção necessária de Jeb Pyre
O maior acerto da série foi a criação de Jeb Pyre. Interpretado por Andrew Garfield, o detetive é um personagem fictício inserido em uma história real — uma escolha que, nas mãos de roteiristas menos habilidosos, poderia naufragar. Aqui, Pyre serve como o avatar do espectador: um mórmon devoto cuja bússola moral é estilhaçada conforme a investigação avança.
A performance de Garfield é magistral pela contenção. Há uma cena específica, onde ele ora sozinho em seu carro após uma descoberta devastadora, que resume o peso da série. Não há gritos ou grandes gestos; apenas a respiração pesada e o olhar de um homem percebendo que as estruturas que sustentam sua vida são feitas de areia. É uma atuação física, onde a tensão se manifesta na postura cada vez mais curvada do ator sob o peso da verdade.
A estética do isolamento e o peso da história
Visualmente, ‘Em Nome do Céu’ evita o brilho artificial das produções genéricas. A fotografia de Craig Wrobleski utiliza tons terrosos e uma luz naturalista que evoca a sensação de algo antigo e imutável. A montagem é deliberadamente lenta, intercalando a investigação de 1984 com flashbacks da fundação da Igreja Mórmon no século XIX.
Essa estrutura não é apenas didática; ela estabelece uma linhagem de violência. Ao conectar o crime da família Lafferty aos dogmas fundacionais da religião, a série argumenta que o fanatismo não é um erro do sistema, mas, às vezes, um recurso do próprio sistema. É um material denso que exige paciência, mas recompensa com uma profundidade que ‘Dahmer’ ou produções similares jamais alcançaram.
Um elenco de apoio sem elos fracos
Embora Garfield seja o centro gravitacional, o elenco de apoio é formidável. Wyatt Russell entrega uma transformação assustadora como Dan Lafferty, capturando a transição sutil da piedade para o delírio messiânico. Daisy Edgar-Jones, como Brenda, consegue a proeza de não ser apenas uma ‘vítima de flashback’; ela é estabelecida como uma força intelectual e progressista, o que torna o desfecho da sua história ainda mais trágico e revoltante.
Veredito: Por que reassistir agora?
Com apenas sete episódios, a série funciona como um thriller de prestígio que não subestima a inteligência do público. Ela é essencial não apenas pelo valor histórico ou pela curiosidade sobre a cultura mórmon, mas por sua relevância sociológica. Em um mundo onde o discurso religioso continua sendo usado para validar extremismos políticos e sociais, ‘Em Nome do Céu’ permanece como um alerta técnico e narrativo impecável sobre os perigos da fé sem questionamento.
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Perguntas Frequentes sobre ‘Em Nome do Céu’
Onde posso assistir ‘Em Nome do Céu’?
No Brasil, a série está disponível exclusivamente no catálogo do Disney+ (antigo Star+). É uma produção original da FX para o Hulu.
A série é baseada em uma história real?
Sim. A série adapta o livro homônimo de Jon Krakauer sobre o assassinato de Brenda Lafferty e sua filha em 1984, ocorrido em Utah, Estados Unidos, cometido por membros fundamentalistas da família Lafferty.
O detetive Jeb Pyre existiu na vida real?
Não. O personagem de Andrew Garfield foi criado especificamente para a série para representar o conflito interno de um fiel confrontando os pecados de sua própria religião.
Quantos episódios tem a minissérie?
‘Em Nome do Céu’ é uma minissérie completa em 7 episódios, com duração média de 60 a 90 minutos cada.
Andrew Garfield ganhou o Emmy por este papel?
Andrew Garfield foi indicado ao Emmy de Melhor Ator em Minissérie ou Telefilme em 2022 por sua atuação, mas não levou o prêmio na ocasião, embora sua performance tenha sido aclamada pela crítica mundial.

