Em ‘Avatar: Fogo e Cinzas’, James Cameron inverte a dinâmica central da franquia: agora é Quaritch quem experimenta Pandora como Na’vi, enquanto Jake decide se seu antigo inimigo merece a mesma chance de transformação. Analisamos por que essa rivalidade finalmente justifica três filmes.
Há uma cena em ‘Avatar: Fogo e Cinzas’ que resume perfeitamente a transformação mais interessante da franquia até agora. Jake Sully, o ex-marine que há quinze anos recebeu o conselho “não vá longe demais na floresta”, agora é quem dá esse mesmo aviso a Quaritch. A ironia não é acidental — é o coração pulsante do terceiro filme de James Cameron.
O que começou como um conflito militar direto entre soldado e invasor evoluiu para algo que nenhum dos dois personagens poderia prever. E, honestamente, é a primeira vez que sinto que a rivalidade entre Jake e Quaritch justifica três filmes para ser explorada.
O paradoxo de Quaritch: destruir aquilo que está se tornando
Stephen Lang descreveu algo fascinante em entrevista recente: Quaritch está “tentando desesperadamente se agarrar a algo que lembra” — sua identidade militar, sua hierarquia, seu propósito. Os dois personagens ainda se tratam como Coronel e Cabo, mesmo habitando corpos Na’vi. É quase patético, no melhor sentido dramático da palavra.
Essa insistência em manter títulos militares enquanto respiram por brânquias e correm em quatro patas revela o terror existencial que Cameron está explorando. Quaritch não é mais apenas o vilão unidimensional de ‘Avatar’. Ele é um homem — ou o que resta de um — confrontando a possibilidade de que tudo que ele era não faz mais sentido.
A conexão de Quaritch com Varang, líder do Povo das Cinzas interpretada por Oona Chaplin, não é apenas um subplot romântico. É o catalisador que força o coronel a experimentar Pandora da única forma que ele sempre se recusou: como parte dela, não como conquistador.
Jake Sully: de convertido a guardião relutante
Sam Worthington fez uma observação que passou despercebida por muitos: “Quando dirigem o corpo Na’vi, eles se tornam mais humanos”. Parece contraditório, mas faz todo sentido. A humanidade que Jake descobriu não veio de sua espécie — veio de Pandora.
O Jake de ‘Fogo e Cinzas’ carrega o peso de quinze anos vivendo como Na’vi. Ele não é mais o marine deslumbrado do primeiro filme, nem o pai protetor fugindo do segundo. Agora ele precisa decidir se Quaritch merece a mesma chance de transformação que ele teve. E essa é uma pergunta muito mais interessante do que “quem vai ganhar a batalha final”.
Worthington menciona um “grande confronto no meio do filme” onde a energia entre os dois muda. A hierarquia militar que Lang descreveu começa a ruir. Uma igualdade “orgânica” emerge — não porque alguém venceu, mas porque ambos perderam quem eram.
Por que essa inversão funciona (quando poderia facilmente não funcionar)
Cameron está jogando um jogo arriscado. Humanizar seu vilão principal depois de dois filmes poderia parecer manipulação barata. Mas o que diferencia ‘Fogo e Cinzas’ é que a transformação de Quaritch não apaga seus crimes — ela os complica.
O coronel não está sendo redimido. Está sendo forçado a entender exatamente o que destruiu. É uma forma de punição muito mais cruel do que qualquer morte em batalha: viver como aquilo que você desprezava e descobrir que talvez você estava errado o tempo todo.
Jake, por sua vez, enfrenta o dilema oposto. Ele passou de traidor para herói, de humano para Na’vi, de soldado para líder espiritual. Mas e se a pessoa que ele mais odeia começar a trilhar o mesmo caminho? O que isso diz sobre a exclusividade da sua própria transformação?
O Povo das Cinzas como espelho narrativo
A introdução do clã liderado por Varang não é apenas expansão de mundo — é ferramenta dramatúrgica. Esse povo que vive entre fogo e destruição oferece a Quaritch algo que os Omaticaya jamais poderiam: aceitação sem julgamento prévio. Eles não conhecem o coronel que massacrou a Árvore-Lar. Conhecem apenas o Na’vi que chegou perdido.
É através dessa comunidade que Cameron consegue fazer o impensável: dar a Quaritch uma experiência paralela à de Jake no primeiro filme. A diferença crucial é que Jake escolheu Pandora. Quaritch está sendo escolhido por ela, queira ou não.
O que esperar da dinâmica em ‘Fogo e Cinzas’
Com projeções de abertura global em torno de US$ 350 milhões e recepção crítica mais dividida que os anteriores, ‘Avatar: Fogo e Cinzas’ enfrenta o desafio de convencer audiências de que ainda há história para contar. As críticas sugerem que nem todos estão comprados nessa evolução mais lenta e psicológica.
Mas para quem acompanha a franquia desde 2009, a inversão entre Jake e Quaritch oferece algo que os dois primeiros filmes apenas insinuavam: consequências emocionais reais para a premissa de “trocar de corpo”. Não é só sobre tecnologia ou guerra. É sobre o que acontece quando você vive tempo suficiente como outro ser para esquecer quem você era.
Cameron sempre foi melhor em construir mundos do que personagens. Se ‘Fogo e Cinzas’ finalmente equilibra essa balança, a espera de treze anos entre o primeiro e o segundo filme — e os três anos até este — pode ter valido a pena. Não pela escala visual, que já sabemos que será impressionante, mas pela possibilidade de que Jake e Quaritch finalmente se tornem tão interessantes quanto Pandora.
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Perguntas Frequentes sobre ‘Avatar: Fogo e Cinzas’
Preciso assistir os outros filmes de Avatar antes de ‘Fogo e Cinzas’?
Sim, é altamente recomendado. ‘Fogo e Cinzas’ continua diretamente a história de ‘Avatar: O Caminho da Água’ e depende do entendimento da rivalidade entre Jake e Quaritch estabelecida nos dois primeiros filmes. Sem esse contexto, a inversão de dinâmica que é o centro do terceiro filme perde muito do impacto.
Quem é Varang em ‘Avatar: Fogo e Cinzas’?
Varang é a líder do Povo das Cinzas, um novo clã Na’vi introduzido neste filme. Interpretada por Oona Chaplin, ela desenvolve uma conexão com Quaritch que se torna central para a transformação do personagem ao longo da narrativa.
Quanto tempo dura ‘Avatar: Fogo e Cinzas’?
‘Avatar: Fogo e Cinzas’ tem aproximadamente 3 horas de duração, seguindo o padrão estabelecido por ‘O Caminho da Água’. Cameron mantém sua preferência por narrativas épicas que exploram Pandora em detalhe.
Quaritch é redimido em ‘Avatar: Fogo e Cinzas’?
Sem spoilers: o filme complica a questão em vez de resolvê-la. A transformação de Quaritch não apaga seus crimes — ela o força a confrontá-los de uma perspectiva que ele nunca teve. É menos sobre redenção e mais sobre consequências existenciais.
Vale a pena assistir ‘Avatar: Fogo e Cinzas’ em IMAX 3D?
Se você pretende assistir no cinema, IMAX 3D é a experiência que Cameron desenhou para o filme. A tecnologia de captura de performance e os ambientes vulcânicos do Povo das Cinzas foram criados especificamente para aproveitar o formato. Dito isso, o foco mais intimista na dinâmica entre personagens significa que a história funciona mesmo em telas menores.

