De Marlee Matlin a Matthew Perry, analisamos como atores convidados criaram alguns dos momentos mais memoráveis de ‘West Wing’. Por que três episódios renderam mais indicações ao Emmy para Perry do que toda sua carreira em ‘Friends’ — e o que isso revela sobre o método de Aaron Sorkin.
Existe um tipo de série que transforma atores convidados em lendas. As participações especiais em ‘West Wing’ se tornaram tão icônicas que, em alguns casos, eclipsaram arcos inteiros de personagens fixos. Não é exagero: Matthew Perry ganhou mais indicações ao Emmy por três episódios de ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ do que por uma década inteira em ‘Friends’.
Aaron Sorkin sempre teve um talento particular para escalar atores. Mas em ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’, ele encontrou o cenário perfeito para isso. A Casa Branca é, por natureza, um lugar de encontros transitórios — advogados, assessores, jornalistas, ativistas entram e saem das vidas dos protagonistas. Cada crise política traz um novo rosto. Cada vitória exige um novo aliado. E Sorkin aproveitou essa estrutura para criar algo raro: participações especiais que não eram apenas figuração de luxo, mas peças fundamentais da engrenagem emocional da série.
Emily Procter e a arte de discordar sem ser odiada
Ainsley Hayes é, possivelmente, o personagem convidado mais difícil de executar em toda a série. Pense no desafio: uma republicana convicta entrando para trabalhar em uma Casa Branca democrata, em um show cujo público é majoritariamente progressista. O roteiro pede que ela discorde dos protagonistas — constantemente. Um passo em falso e o personagem vira caricatura ou, pior, vilã involuntária.
Emily Procter não apenas evitou essas armadilhas como transformou Ainsley em uma das presenças mais queridas da série. O segredo está no equilíbrio impossível que ela encontra: modesta sem ser passiva, opinativa sem ser contrária por esporte, brilhante sem ser condescendente. Quando ela enfrenta Sam Seaborn em um debate televisionado no episódio piloto de sua participação, você entende por que Leo McGarry a quer na equipe — e por que o público deveria querer também.
Seus melhores momentos, curiosamente, são cômicos. A entrevista inicial com Leo é um exercício de diálogo absurdamente travado mas perfeitamente entregue. E quando ela descobre que seu escritório fica no “Steam Pipe Trunk Distribution Venue” — vulgo porão —, a reação de Procter consegue ser hilária e dignificada ao mesmo tempo. A saída prematura de Ainsley da série permanece uma das maiores perdas de ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’.
Matthew Perry encontrou em Joe Quincy o que ‘Friends’ nunca lhe deu
Perry era fã obsessivo de ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ antes de aparecer na série. Em suas memórias, ele descreve assistir aos episódios religiosamente, provavelmente imaginando como seria fazer parte daquele universo. Quando finalmente conseguiu o papel de Joe Quincy, entregou algo que Chandler Bing nunca permitiu: profundidade contida.
A química entre Perry e Bradley Whitford (Josh Lyman) é instantânea e magnética. Na entrevista de emprego que se estende por um episódio inteiro devido a um lockdown na Casa Branca, Perry irradia uma competência agradável que é simultaneamente desconcertante e inofensiva. Josh não consegue identificar o que o incomoda em Quincy — e quando Donna pergunta “Você está escrevendo poesia sobre isso agora?”, a pergunta é genuinamente válida.
Três episódios. Duas indicações ao Emmy. Mais do que toda a sua década em ‘Friends’. Isso diz algo sobre o material que Sorkin oferecia e sobre o que Perry era capaz de fazer quando não estava preso a um personagem definido por piadas. A parceria funcionou tão bem que Sorkin construiu sua série seguinte, ‘Studio 60 on the Sunset Strip’, inteiramente ao redor de uma dupla Perry/Whitford.
Marlee Matlin transformou Joey Lucas em muito mais que um interesse romântico
O padrão de ‘interesse amoroso temporário’ em séries de TV é bem conhecido: personagem aparece, cria tensão romântica, desaparece. Joey Lucas poderia facilmente ter sido isso. Marlee Matlin não deixou.
Joey é surda, como Matlin na vida real, e nunca aparece sem seu intérprete Kenny (Bill O’Brien, em uma performance subestimada). Os dois funcionam em sincronia perfeita, entregando falas em dupla com timing cômico ou dramático impecável. Mas os momentos mais memoráveis de Joey são quando ela dispensa a ajuda de Kenny para enfatizar um ponto — “You idiot! I’m. Joey. Lucas!” é uma linha que funciona justamente porque quebra o padrão estabelecido.
Diferente de Amy Gardner (Mary-Louise Parker), que traz caos pessoal e profissional para a vida de Josh, Joey eleva tudo ao seu redor. Ela se torna uma aliada confiável da administração como pesquisadora de opinião pública, respeitada por competência genuína. E quando está em cena com Josh, consegue algo raro: fazer você torcer por ela mesmo sabendo que Donna é o destino final dele.
Adam Arkin e o episódio que redefiniu o que TV podia fazer com trauma
“Noël” é frequentemente citado como um dos melhores episódios de televisão já produzidos. Grande parte desse mérito vai para Bradley Whitford, que carrega o peso emocional de Josh confrontando seu PTSD não diagnosticado. Mas Adam Arkin, como o terapeuta Stanley Keyworth, é o catalisador que torna tudo possível.
Keyworth é apresentado como alguém que lê Josh como um livro aberto — e Josh resiste a cada página virada. A dinâmica entre os dois é uma masterclass em tensão terapêutica: Keyworth empurra, Josh recua, Keyworth empurra mais. E então, no momento em que Josh finalmente cede e quer mais terapia, Keyworth encerra a sessão abruptamente. “Você é um caso fácil demais para mim.”
Arkin retorna mais tarde para tratar a insônia do Presidente Bartlet em “Night Five” e “Holy Night”, provando que Keyworth funciona independentemente de quem está na cadeira oposta. Ele consegue ir de igual para igual com Martin Sheen — não é pouca coisa.
Mark Harmon provou que quatro episódios bastam para partir corações
Anos antes de se tornar sinônimo de ‘NCIS: Investigação Naval’, Mark Harmon apareceu em ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ como o agente do Serviço Secreto Simon Donovan. CJ recebe ameaças de morte e ganha proteção temporária. Ela odeia a ideia. E então, gradualmente, não odeia mais.
Harmon traz uma elegância silenciosa para Donovan que permite a CJ baixar a guarda. Os dois se apaixonam — e em uma série onde os personagens principais raramente conseguem equilibrar trabalho e vida pessoal, isso parece uma vitória genuína. “The Black Vera Wang” e “We Killed Yamamoto” mostram CJ recebendo atenção romântica merecida, algo que a personagem quase nunca tem.
E então, no episódio seguinte, Donovan morre. Baleado ao interromper um assalto a uma mercearia. Quatro episódios. Um arco completo. Uma das mortes mais devastadoras da série. Harmon conseguiu fazer você se importar profundamente com alguém que você mal conhecia — e isso é atuação de primeiro nível.
Oliver Platt carregou o peso legal da maior crise da série
Quando a esclerose múltipla do Presidente Bartlet vem a público, alguém precisa navegar o pesadelo legal que se segue. Esse alguém é Oliver Babish, o novo Conselheiro da Casa Branca interpretado por Oliver Platt.
Babish pressiona cada membro do staff além do limite de conforto — incluindo o próprio Presidente. Mas Platt faz isso sem nunca perder uma aura de confiança e profissionalismo que mantém o espectador acreditando que, talvez, tudo vá ficar bem. A cena em que ele interroga CJ sobre a diferença entre perguntar ao Presidente “há algo que eu deveria saber” versus “há algo que eu preciso saber” é tensão pura — você sente o peso de cada palavra.
E ainda assim, Platt encontra momentos de humor genuíno que cortam a tensão. É um equilíbrio que ele aperfeiçoaria décadas depois em ‘O Urso’, mas que já estava evidente aqui.
Elisabeth Moss antes de ser Elisabeth Moss
Ela tinha 17 anos quando apareceu pela primeira vez como Zoey Bartlet, a filha mais nova do Presidente. Hoje, depois de ‘Mad Men’ e ‘The Handmaid’s Tale’, é fácil olhar para trás e ver o talento óbvio. Na época, era apenas uma adolescente em um papel que poderia ser descartável.
Moss não deixou. Seu arco mais poderoso acontece em duas partes separadas por três temporadas. Na primeira, o Presidente confronta Zoey sobre os perigos e privilégios de sua posição, deixando-a em lágrimas. Na quarta temporada, ela é sequestrada — exatamente o cenário que seu pai havia descrito. A série fecha o círculo de forma devastadora, e Moss carrega o peso emocional de ambos os momentos com uma maturidade que desmente sua idade.
Mesmo em uma carreira repleta de performances memoráveis, Zoey Bartlet merece ser lembrada.
O que essas participações revelam sobre o método Sorkin
Há um padrão claro quando você analisa as melhores participações especiais de ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’: Sorkin não escala atores para preencher espaço. Ele escala para criar fricção. Ainsley Hayes existe para discordar. Joey Lucas existe para complicar a vida amorosa de Josh de uma forma que Donna não pode. Oliver Babish existe para pressionar personagens que normalmente controlam a sala.
Mas fricção sozinha não basta. O que diferencia essas participações é que cada ator encontrou humanidade em personagens que poderiam facilmente ser funcionais. Felicity Huffman, vinda de ‘Sports Night’ (outro projeto de Sorkin), aparece em um único episódio como Ann Stark e consegue criar uma dinâmica desconfortável entre Toby e CJ que reverbera além de sua presença em tela. John Larroquette traz suas raízes de sitcom de ‘Night Court’ para criar Lionel Tribbey, um personagem que anda pela Casa Branca ameaçando pessoas com um taco de críquete mas que, no final, se revela genuinamente protetor.
Mary-Louise Parker conseguiu seu papel ligando diretamente para Sorkin e deixando um recado dizendo que “Josh Lyman precisa urgentemente de sexo e eu sou a pessoa certa para isso.” Ela apareceu no episódio seguinte. Esse tipo de ousadia define o espírito da série — e o tipo de ator que ela atraía.
Por que essas participações ainda importam
Com ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ de volta à Netflix, uma nova geração está descobrindo a série. E o que vai surpreendê-los, além dos diálogos impossíveis de Sorkin e do idealismo político que parece de outro planeta, é como atores que aparecem por meia dúzia de episódios deixam marcas tão profundas.
Isso não acontece por acidente. Acontece porque Sorkin entendia algo fundamental: em uma série sobre política, as pessoas que entram e saem da vida dos protagonistas são tão importantes quanto os protagonistas em si. Cada advogado, terapeuta, agente secreto ou republicana infiltrada representa uma perspectiva que os personagens principais não têm. E quando você escala atores do calibre de Matthew Perry, Marlee Matlin ou Oliver Platt para essas funções, o resultado transcende a participação especial tradicional.
Esses não são cameos. São performances que, em alguns casos, definem temporadas inteiras. E se você está assistindo ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ pela primeira vez — ou revisitando depois de anos —, preste atenção nos rostos que aparecem por poucos episódios. Alguns dos melhores momentos da série estão nas mãos de pessoas que tecnicamente eram apenas visitantes.
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Perguntas Frequentes sobre Participações Especiais em ‘West Wing’
Onde assistir ‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’?
‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ está disponível na Netflix Brasil. Todas as sete temporadas podem ser assistidas na plataforma com legendas e dublagem em português.
Matthew Perry ganhou Emmy por ‘West Wing’?
Matthew Perry foi indicado ao Emmy de Melhor Ator Convidado em Série Dramática por sua participação como Joe Quincy em ‘West Wing’, mas não venceu. Ainda assim, suas duas indicações por apenas três episódios superaram o reconhecimento que recebeu por dez anos interpretando Chandler Bing em ‘Friends’.
Qual episódio de ‘West Wing’ é considerado o melhor?
“Noël” (temporada 2, episódio 10) é frequentemente citado como o melhor episódio da série. Nele, Josh Lyman confronta seu PTSD após o tiroteio em Rosslyn, com Adam Arkin brilhando como o terapeuta Stanley Keyworth. “Two Cathedrals” (final da temporada 2) também aparece consistentemente no topo das listas.
Por que Emily Procter saiu de ‘West Wing’?
Emily Procter deixou ‘West Wing’ para estrelar ‘CSI: Miami’ como Calleigh Duquesne, papel que interpretou por dez temporadas (2002-2012). Sua personagem Ainsley Hayes fez aparições esporádicas nas temporadas seguintes, mas nunca retornou como regular.
Quantas temporadas tem ‘West Wing’?
‘West Wing: Nos Bastidores do Poder’ tem sete temporadas e 156 episódios, exibidos originalmente entre 1999 e 2006. Aaron Sorkin foi showrunner das quatro primeiras temporadas, saindo após a quarta devido a conflitos com a produção.

