‘A Talismã’: a maldição que nem os Duffer Brothers conseguiram quebrar

Analisamos por que a adaptação de ‘A Talismã’, épico de Stephen King, foi cancelada pela Netflix. Entenda os desafios técnicos, o conceito dos ‘Duplos’ e por que nem os criadores de ‘Stranger Things’ conseguiram quebrar a maldição de 40 anos desta obra.

Existem livros que parecem carregar uma resistência intrínseca à transposição para as telas. ‘A Talismã’, a colaboração épica entre Stephen King e Peter Straub, é o caso mais emblemático de Hollywood: uma obra que sobreviveu a seis tentativas de adaptação em quatro décadas e, recentemente, viu sua chance mais promissora desmoronar. O cancelamento do projeto na Netflix, que uniria os Irmãos Duffer (‘Stranger Things’) e Steven Spielberg, confirma que o ‘buraco negro’ narrativo desta história é mais profundo do que se imaginava.

A obsessão de Spielberg e o fantasma de 1984

A obsessão de Spielberg e o fantasma de 1984

A jornada de ‘A Talismã’ nos bastidores do cinema começou antes mesmo do livro chegar às prateleiras. Steven Spielberg comprou os direitos em 1984, hipnotizado pela premissa de Jack Sawyer, um garoto de 12 anos que viaja entre os Estados Unidos e um mundo paralelo — os Territórios — para salvar sua mãe.

O que parecia o material perfeito para o diretor de ‘E.T. – O Extraterrestre’ tornou-se um labirinto burocrático. Em depoimentos ao podcast The Kingcast, King revelou que as primeiras negociações com a Universal foram marcadas por atritos entre o autor e Sidney Sheinberg, então presidente do estúdio. O projeto ficou no limbo enquanto Hollywood tentava entender como traduzir a escala de uma road trip que alterna entre a América rural e uma realidade fantástica medieval.

Por que os Duffer Brothers pareciam a escolha definitiva

Se alguém possuía o DNA necessário para quebrar essa maldição, eram Matt e Ross Duffer. Em ‘Stranger Things’, eles provaram dominar a ‘estética King’: o equilíbrio entre o horror visceral e o maravilhamento infantil, temperado por uma trilha sonora atmosférica e um design de som que evoca o sobrenatural de forma tátil.

A colaboração com a Amblin (produtora de Spielberg) na Netflix tinha o orçamento e a liberdade criativa que faltaram nas tentativas anteriores (como a minissérie abortada da ABC nos anos 90). No entanto, o próprio Matt Duffer admitiu que a escala de ‘A Talismã’ é enganosa. Não se trata apenas de uma história de fantasia; é uma narrativa que exige a criação de dois mundos coexistentes, onde cada personagem possui um ‘Duplo’ (Twinner) na outra dimensão.

O pesadelo técnico: os Territórios e o Hotel Negro

O pesadelo técnico: os Territórios e o Hotel Negro

O fracasso desta última tentativa expõe o verdadeiro problema: ‘A Talismã’ é tecnicamente proibitivo. Para ser fiel ao material, a produção precisaria de efeitos visuais de nível blockbuster em quase todos os episódios. A sequência final no ‘Hotel Negro’, uma construção senciente e maleável que desafia a geometria, exigiria um virtuosismo técnico que rivaliza com as produções mais caras da história da TV.

Além disso, há o desafio do protagonista. Jack Sawyer precisa ter 12 anos para que o peso emocional da jornada funcione. Em uma estrutura de série, o crescimento acelerado dos atores mirins — um problema que os próprios Duffers enfrentaram em ‘Stranger Things’ — torna-se um risco logístico fatal para uma obra que se passa em um curto intervalo de tempo.

O futuro da obra: uma busca impossível?

Com a saída dos Duffers e o silêncio da Netflix, ‘A Talismã’ retorna à prateleira de ‘projetos infilmáveis’. A morte de Peter Straub em 2022 e a idade avançada de King e Spielberg sugerem que a janela para uma adaptação ‘definitiva’ está se fechando.

No fim, a maldição de ‘A Talismã’ talvez seja apenas a sua própria qualidade literária. A prosa de King e Straub é tão dependente da atmosfera e das regras internas de sua mitologia que qualquer versão audiovisual corre o risco de ser apenas uma sombra pálida da experiência de leitura. Para o fã de cinema, resta a melancolia de não ver os Territórios ganharem vida; para o leitor, resta o conforto de que o livro permanece intocado e invicto.

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Perguntas Frequentes sobre ‘A Talismã’ de Stephen King

Por que a série de ‘A Talismã’ foi cancelada na Netflix?

Embora não haja um comunicado oficial único, os Irmãos Duffer indicaram que a escala do projeto e a complexidade de adaptar a narrativa foram maiores que o esperado. Mudanças estratégicas na Netflix sobre orçamentos de grandes épicos também influenciaram a decisão.

Sobre o que fala o livro ‘A Talismã’?

Escrito por Stephen King e Peter Straub, o livro segue Jack Sawyer, um menino que viaja entre o nosso mundo e uma realidade paralela chamada ‘Os Territórios’ para encontrar um talismã mágico capaz de curar sua mãe do câncer.

Steven Spielberg ainda está envolvido com ‘A Talismã’?

Spielberg detém os direitos da obra desde 1984 através da Amblin Entertainment. Apesar do cancelamento na Netflix, ele continua interessado no projeto, mas não há uma nova casa ou previsão para uma futura tentativa.

O livro ‘A Talismã’ tem continuação?

Sim. Stephen King e Peter Straub escreveram uma sequência chamada ‘A Casa Negra’ (Black House), que mostra Jack Sawyer já adulto trabalhando como detetive e investigando crimes que se conectam com o multiverso de King.

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Lucas Lobinco
Lucas Lobinco
Sou o Lucas, e minha paixão pelo cinema começou com as aventuras épicas e os clássicos de ficção científica que moldaram minha infância. Para mim, cada filme é uma nova oportunidade de explorar mundos e ideias, uma janela para a criatividade humana. Minha jornada não foi nos bastidores da produção, mas sim na arte de desvendar as camadas de uma boa história e compartilhar essa descoberta. Sou movido pela curiosidade de entender o que torna um filme inesquecível, seja a complexidade de um personagem, a inovação visual ou a mensagem atemporal. No Cinepoca, meu foco é trazer uma perspectiva única, mergulhando fundo nos detalhes que fazem um filme valer a pena, e incentivando você a ver a sétima arte com novos olhos.Tenho um apreço especial por filmes de ação e aventura, com suas narrativas grandiosas e sequências de tirar o fôlego. A comédia de humor negro e os thrillers psicológicos também me atraem, pela forma como subvertem expectativas e exploram o lado mais sombrio da psique humana. Além disso, estou sempre atento às novas vozes e tendências que surgem na indústria, buscando os próximos grandes talentos e as histórias que definirão o futuro do cinema.

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