Exploramos a história bizarra por trás de ‘Stay Alive’ e ‘Hellraiser’ (2022), os únicos slashers financiados pela Disney. Entenda como a censura interna e as aquisições corporativas criaram essas anomalias sangrentas no catálogo do estúdio.
A imagem da Disney é construída sobre alicerces de castelos mágicos, princesas e resoluções morais impecáveis. No entanto, escondidos nos arquivos corporativos, existem capítulos que o estúdio do Mickey Mouse prefere manter trancados sob sete chaves: as raras vezes em que o conglomerado financiou slashers da Disney. Não estamos falando de vilões que caem de penhascos para evitar o sangue na tela, mas de produções onde o gore e a mutilação são as estrelas do show.
‘Stay Alive: Jogo Mortal’ e o reboot de ‘Hellraiser’ (2022) são as maiores anomalias desse catálogo. Eles representam momentos em que a máquina de entretenimento mais higienizada do mundo se viu, por acidente ou estratégia de aquisição, bancando demônios que rasgam carne humana. Analisamos como esses filmes sobreviveram ao filtro conservador do estúdio e por que eles permanecem como cicatrizes fascinantes na história da empresa.
Hollywood Pictures: A ‘lavanderia’ de conteúdo adulto da Disney
Para entender como um slasher chega à Disney, é preciso entender a Hollywood Pictures. Criada nos anos 80, ela era o braço do estúdio destinado ao que o marketing chamava de ‘filmes de prestígio para adultos’ — uma forma elegante de dizer que o logo do castelo não apareceria antes de cenas de violência ou sexo. Foi por este selo que saíram sucessos como ‘O Sexto Sentido’ e ‘Aracnofobia’.
Em 2006, a Hollywood Pictures já estava respirando por aparelhos quando deu luz verde para ‘Stay Alive’. A ideia era capitalizar na febre dos games, mas o resultado foi um choque cultural interno que quase enterrou o filme antes da estreia.
‘Stay Alive’: O slasher que a Disney tentou castrar
A premissa é puro suco dos anos 2000: um grupo de amigos joga um videogame obscuro baseado na história real da Condessa Elizabeth Bathory. Se você morre no jogo, morre na vida real da mesma forma. O elenco era um ‘quem é quem’ das séries teens da época, com Milo Ventimiglia (‘Heroes’), Frankie Muniz (‘Malcolm’) e Sophia Bush (‘One Tree Hill’).
O problema é que o diretor William Brent Bell entregou um filme de horror visceral, com classificação R (para maiores de 17 anos). A Disney, em pânico com o potencial de dano à marca, ordenou cortes severos. Cerca de 15 minutos de carnificina foram removidos para forçar uma classificação PG-13. O resultado nos cinemas foi uma obra confusa e sem impacto.
A redenção veio apenas no mercado de home vídeo com o Director’s Cut. Nesta versão, as mortes são brutais — incluindo uma decapitação por carruagem fantasmagórica que jamais passaria pelo crivo de um executivo do Disney Channel. É um filme datado? Sim. Mas como um guilty pleasure que sobreviveu à censura do Mickey, ele possui um valor histórico inegável para os fãs do gênero.
‘Hellraiser’ (2022) e a ironia da ‘Princesa Disney’
Se ‘Stay Alive’ foi um erro de percurso, o reboot de ‘Hellraiser’ em 2022 foi um subproduto de uma gigante faminta. Quando a Disney adquiriu a 20th Century Fox, ela herdou franquias que não combinam com o Disney+: ‘Alien’, ‘Predador’ e a saga dos Cenobitas de Clive Barker.
Produzido pela 20th Century Studios (agora sob comando da Disney) e lançado diretamente no Hulu, o novo ‘Hellraiser’ trouxe Jamie Clayton como uma Pinhead magnífica. A internet não perdoou: o termo ‘Princesa Disney’ foi ironicamente atribuído à Sacerdotisa do Inferno. Mas, apesar da piada, o filme é um slasher sobrenatural sério, elegante e extremamente sangrento.
Diferente dos originais de Barker, que focavam no sadomasoquismo filosófico, o reboot de 2022 estrutura-se mais como um slasher moderno: um grupo de jovens é caçado um a um em uma mansão isolada, com armadilhas mecânicas e punições físicas detalhadas. A Disney, sabiamente, removeu seu nome dos créditos principais de abertura, deixando apenas o selo da Spyglass e da Phantom Four, provando que ainda teme a associação direta com o sofrimento eterno dos Cenobitas.
Por que o catálogo de terror da Disney parou por aqui?
A existência desses filmes prova que, em um conglomerado desse tamanho, brechas acontecem. No entanto, a estratégia atual é o isolamento. Filmes como ‘The First Omen’ (2024) e o próprio ‘Hellraiser’ são mantidos estritamente sob a bandeira da 20th Century ou Searchlight, sem qualquer cruzamento visual com a marca principal.
A Disney não produz slashers por desejo artístico; ela os herda ou os tolera. ‘Stay Alive’ e ‘Hellraiser’ são os pontos fora da curva que lembram ao espectador que, por trás das cores vibrantes e músicas alegres, o estúdio também detém os direitos sobre os nossos pesadelos mais viscerais. Só não espere ver Pinhead desfilando na Main Street de Orlando tão cedo.
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Perguntas Frequentes sobre os Slashers da Disney
Onde posso assistir ‘Stay Alive: Jogo Mortal’?
Atualmente, ‘Stay Alive’ costuma aparecer em catálogos de aluguel digital (Apple TV e Prime Video). Recomenda-se buscar a versão ‘Unrated Director’s Cut’ para a experiência completa de slasher.
‘Hellraiser’ de 2022 está disponível no Disney+?
No Brasil, devido à classificação indicativa, ‘Hellraiser’ está disponível no Disney+ dentro da aba Star (antigo Star+), que concentra o conteúdo adulto do estúdio.
Por que ‘Stay Alive’ é considerado um filme da Disney?
O filme foi produzido pela Hollywood Pictures, um selo que pertencia integralmente à The Walt Disney Company, criado especificamente para lançar filmes que não se encaixavam no perfil infantil da marca.
Existem outros filmes de terror produzidos pela Disney?
Sim, mas raramente são slashers. Exemplos incluem ‘O Sexto Sentido’, ‘Os Outros’ (via Dimension/Miramax na época) e o clássico cult ‘Olhos na Floresta’ (The Watcher in the Woods).

